Um marco na pesquisa histórica e científica foi alcançado com a apresentação de um estudo no 24º Encontro Europeu da Associação de Paleopatologia, realizado em agosto de 2024, na Holanda. Pela primeira vez, foi relatado um genoma pré-histórico da bactéria Yersinia pestis fora da Eurásia, revelando que a peste bubônica esteve presente no antigo Egito. Embora não seja possível determinar a extensão da doença nesse período, a descoberta amplia o entendimento da história da humanidade e das pandemias.
Descoberta em uma múmia egípcia

Vestígios da perigosa bactéria patogênica foram encontrados em uma antiga múmia egípcia, datada de aproximadamente 3,29 mil anos. Esse indivíduo do sexo masculino, preservado por embalsamamento, provavelmente sofria de sintomas severos antes de sua morte. Os sintomas incluíam linfonodos inchados e dolorosos (bubões), febre alta e calafrios, característicos da peste bubônica.
A datação por radiocarbono situou a múmia no final do Segundo Período Intermediário ou início do Novo Reino, um período em que o Egito se destacava como uma das maiores potências do mundo antigo. A presença do DNA da bactéria no tecido ósseo e no conteúdo intestinal sugere que a doença estava em um estágio avançado quando o indivíduo faleceu.
Entendendo a peste bubônica
A Yersinia pestis é uma bactéria em forma de bastonete, gram-negativa, associada a infecções graves, e manifesta-se em três formas principais:
- Peste bubônica: caracterizada por bubões, febre e calafrios.
- Peste septicêmica: infecção disseminada no sangue.
- Peste pneumônica: forma respiratória altamente contagiosa.

Embora a peste bubônica seja mais conhecida por seu impacto na Europa do século XIV, onde dizimou um terço da população, evidências arqueológicas mostram que a doença é muito mais antiga. Vestígios da bactéria foram encontrados em esqueletos da Idade do Bronze, com cerca de 5,8 mil anos, antes mesmo de a Y. pestis desenvolver a capacidade de causar peste bubônica.
A peste no contexto do Egito antigo
Antes da análise dessa múmia, já havia indícios de surtos ao longo das margens do Nilo. Estudos realizados há mais de 20 anos identificaram a presença de pulgas em Amarna, uma vila arqueológica onde trabalhadores construíram a tumba de Tutancâmon. Como as pulgas são os principais vetores da peste, levantou-se a hipótese de que a doença poderia ter existido na região.

Outro dado histórico que corrobora a presença da peste é o Papiro Ebers, um dos documentos médicos mais antigos conhecidos. Datado de aproximadamente 1.550 a.C., o texto descreve sintomas como: “produziu um bubão e o pus se petrificou”, sugerindo um possível registro médico da doença.
Impacto da descoberta
Essa pesquisa não apenas redefine os limites geográficos conhecidos da Yersinia pestis, mas também enriquece a compreensão sobre as condições sanitárias e os desafios enfrentados pelas civilizações antigas. Além disso, destaca a importância da colaboração interdisciplinar entre arqueologia, biologia molecular e história para desvendar os segredos do passado.
A combinação de avanços tecnológicos e análises históricas promete revelar ainda mais sobre o impacto de doenças no curso da humanidade. Cada descoberta nos aproxima de uma compreensão mais ampla de nossa história compartilhada.